terça-feira, 2 de outubro de 2012

A fragilidade está nos olhos de quem vê

Edson trabalhava como guarda para Ceará, o chefe do morro do Galo Louco. Ele era um rapaz alto, moreno-escuro e inesperadamente bonito para alguém com tão sofrida existência.
Isabela era a garota mais inteligente do morro, conseguiu uma bolsa para estudar enfermagem em uma das escolas mais caras do Rio e era tida como uma heroína em sua comunidade.
E como se não bastasse o fato de ser inteligente, Isabela também era uma das mulheres mais bonitas da favela, e talvez até da cidade: volumosos cabelos ondulados que exalavam um cheiro angelical por onde ela passava, rosto delicado como o de uma princesa, lábios voluptuosos e um corpo que parecia ter sido moldado pelo próprio criador em uma bela obra prima de ébano.
Edson era encarregado da ronda noturna na área onde ela morava o que causou deles se encontrarem quase todos os dias e trocarem algumas palavras e alguns olhares. E tao inevitavelmente quanto o dia dá lugar à noite, Edson se apaixonou perdidamente por Isabela.
E sendo o amor o ponto fraco de todo guerreiro, Edson, um homem que já havia matado policiais com tiro na cara e assado pessoas no microondas, sentia um estranho peso no peito e perdia a voz toda vez que tentava se declarar à Isabela. E como amar é viver imerso em incorências, Edson se sentia um verme inútil por não conseguir ter em seus braços a mulher que amava,  mas também se sentia o maior herói do mundo quando ela o olhava com aqueles grandes olhos cor de mel e dizia:
-Você é tão gentil, me sinto super segura com você aqui. Boa noite!
Ceará, o dono do morro era conhecido por comer todas as garotas da favela, quer elas queiram ou não. Um dia ele comentou com Edson:
-Tá na hora de comer a geninha logo, antes que ela embarangue. Mulher que estuda demais fica acabada logo.
Ao ouvir isso, o coração de Edson parou por um segundo, e depois começou a bater num compasso desacelerado. A idéia de sua amada ser usada como um brinquedo, como um pedaço de carne para Ceará aliviar suas bolas, lhe tirava a vontade de viver, lhe dava vontade de matar Ceará, matar todo mundo, pra ficar só a Isabela e ele nesse mundo. Mas ele respirou fundo e prometeu a si mesmo manter a calma e pensar em algo.
Nesse meio tempo, Ceará começou suas investidas em Isabela, e elas não pareciam ser bem-sucedidas: ela recusava seus convites para sair, devolvia os presentes e travava um dos maiores traficantes do país como um mero fogueteiro.
A cada negativa de Isabela, Edson se alegrava por dentro, e a admirava cada vez mais por se valorizar tanto e não ceder mesmo ao dono do morro. Ele se questionava de onde vinha tanta força. Talvez fosse porque ela estava apaixonada por outro alguém. Talvez fosse por ele!
Numa fria noite de Junho, Isabela subia o morro e Edson avistou Ceará se aproximando e a agarrando pelos braços. Em um instinto protetor e assassino, Edson atirou certeiramente na cabeça de Ceará que caiu morto na hora. Isabela se assustou e gritou. Para acalmá-la Edson assoviou e acenou para mostrar sua presença e foi andando em sua direção, pronto para lhe dizer como se sentia e a convidar para fugir de lá com ele. Quando se aproximou ela estava com a arma de Ceará nas mãos e atirou em cheio no peito de Edson.
 Enquando se ajoelhava, sangrando e confuso em frente a sua amada, ele ouviu as últimas e piores palavras da sua vida:
-Eu amava esse homem! E você o matou! Quão ridículo de um peão pensar que poderia ficar com uma rainha que pertence ao lado do rei!
"Peão?Rainha?Rei?"-pensou o pobre Edson que mal sabia escrever o próprio nome, quanto mais entender uma metáfora sobre xadrez na hora de sua morte. Uma lágrima de tristeza e dor escorreu pelo seu rosto e ele cai morto no chão. Xeque-mate.

FIM

Epílogo
Isabela saiu impune, casou-se com um rico cirurgião e viveu uma vida de riqueza e luxo.